Já passava do meio dia quando meu avião pousou no aeroporto de New Orleans, a cidade do jazz, do voodoo, da culinária incomparável e com uma história de dar inveja às outras milhares de cidades dos EUA. Chovia durante o desembarque e eu não tinha ideia de como chegaria até meu hostel, que ficava no centro da cidade. Depois de pesquisar e descobrir que um ônibus, gratuito naquele sábado cinzento, faria o trajeto do aero até a cidade em menos de uma hora, fui até o 3º andar do edifício e esperei pela minha carona.
Dentro do ônibus, só o motorista e mais uma passageira, essa já nos seus 60 e poucos e com três malas de rodinhas. Depois de cinco minutos de viagem, e uma freada brusca do motorista, ficou claro para nós três que a senhora não conseguiria lidar com todas as suas bagagens durante o percurso, então me ofereci para segurar uma de suas gigantescas malas. 
Depois de 50 minutos, me despedi da senhora das malas e desembarquei no ponto de ônibus que ficava a um bloco de distância do hostel que escolhi me hospedar, o HI New Orleans, em plena Canal Street. Apesar de um check-in um tanto conturbado (uma das recepcionistas não era nada receptiva), peguei minha chave para o quarto 302 e fui conferir minha cama dos próximos dias, que ficava num quarto compartilhado com quatro beliches, onde apenas metade estavam ocupadas.
Como a chuva tinha cessado, guardei minha mochila no armário, peguei a pochete e fui descobrir o que a cidade guardava de melhor.
Um dos mausoléus do Greenwood Cemetery
Um dos mausoléus do Greenwood Cemetery
Visão geral da Jackson Square e da St. Louis Cathedral
Visão geral da Jackson Square e da St. Louis Cathedral
BAIRROS DA CIDADE
Centro
É onde fica a Canal Street, uma das principais avenidas, lar do distrito financeiro e de dezenas de hotéis de redes famosas. Também é o único lugar onde é possível encontrar prédios altos, já que, em sua grande maioria, a cidade conta com casas de no máximo quatro andares. 
Durante o dia nada chama muita atenção por lá, a não ser os bondes, que circulam em duas vias levando e trazendo passageiros de bairros mais distantes, e a arquitetura dos edifícios mais antigos. Mas à noite, as luzes dos letreiros clássicos dos anos 1970 brilham nos olhos daqueles que saem em direção à farra na Bourbon Street, o point de Orleans.
No entanto, assim como qualquer área turística de uma grande cidade, a avenida é repleta de moradores de rua, cheia de lojas de lembrancinhas e de, curiosamente, estabelecimentos oferecendo massagem nos pés por $40. Também não compensa fazer uma refeição por lá, já que a via é infestada de fast foods e restaurantes de redes famosas, com direito até à churrascaria Fogo de Chão.
French Quarter
Foi ali que, em 1718, os franceses atracaram seus barcos à beira do rio Mississipi e fundaram a cidade que conhecemos hoje. Claro que, como era recorrente na época, NoLa (acrônimo para New Orleans, Louisiana)  também sofreu alguns incêndios e teve de ser parcialmente reconstruída durante os séculos que se seguiram, e mesmo durante suas reformulações, o French Quarter manteve seus traços originais, e por isso se consagra como a principal atração da cidade. Caminhar por suas ruelas é como entrar num filme de época, com casas de madeira pintadas em tom pastel, sacadas e varandas metálicas, além dos jardins suspensos que chamam a atenção.

Assim como na Canal Street, a região se transforma da água para o vinho quando o sol baixa, em especial a Bourbon Street, uma rua com pouco mais de 1 km de extensão, que abriga centenas de bares disputando o som mais alto, a decoração mais chamativa e a bebida mais em conta. É uma espécie de mini Las Vegas na parte mais charmosa da cidade, onde o público em geral tem seus 30 e poucos anos e está ali para uma despedida de solteiro(a), assim como é possível reparar nos diversos grupos de amigos vestidos de noivos e noivas.
Fachada de hotel no French Quarter
Fachada de hotel no French Quarter
Restaurante de gumbo, uma sopa tradicional da região
Restaurante de gumbo, uma sopa tradicional da região
Garden District
Com casarões luxuosos, é pacifico e tem um ar mais residencial que o restante da cidade, além disso, abriga duas universidades, a Loyola e Tulane, com campus gigantescos e arquiteturas europeias. Algo que chama a atenção durante o percurso do bonde, que corta a Avenida St. Charles, são as centenas de árvores de carvalho, que também aparecem aos montes no Parque Audubon.

Com duas vezes o tamanho do Parque do Ibirapuera, a área verde guarda lagoas, campo de golfe e inúmeras trilhas para fazer a pé ou de bike. Ali, os sons da cidade desaparecem, dando espaço para o canto das dezenas de espécies de pássaros que vivem por lá, em especial os gansos e garças, que ficam espalhados em grupos pelas planícies verdes.
Marigny
O bairro carrega a verdadeira essência dos creole, termo comum em Louisiana para designar a primeira geração de filhos de escravos africanos com europeus nascidos no início de 1800. Tais descendentes foram responsáveis pela criação da culinária que hoje atrai turistas para NoLa, com muita carne de porco, frutos do mar, sopas e grãos variados. 
Um passeio por lá é muito bem-vindo, além de concentrar as melhores cozinhas para provar a gastronomia local, durante o dia também possível admirar as casas, mais simples, geralmente com um só andar, e pintadas com cores vibrantes, começando no roxo, passando pelo rosa e chegando até o amarelo. De noite, os bares e clubes de jazz recebem aqueles que evitam enfrentar o caos da Bourbon Street.
City Park
A outra área verde da cidade é ainda maior que o parque anterior, e também é mais visitada, já que conta com dois museus, o de Arte Moderna e o da Criança, um jardim de esculturas, parque de diversão para crianças, estádio de basebol, campos de golfe, e muitas outras trilhas para se perder durante o dia. No entanto, tudo tem ingresso cobrado à parte, fazendo com que seja uma atração menos acessível.
O parque também é cercado por meia dúzia de cemitérios, onde os túmulos e mausoléus que são quase como obras de arte vão entreter aqueles que se interessam por algo um tanto macabro. Em um deles ainda está o memorial às vítimas do furacão Katrina, desastre que devastou a cidade em 2005.
Casas do bairro Marigny
Casas do bairro Marigny
Um dos cemitérios do City Park
Um dos cemitérios do City Park
Arredores do Garden District
Arredores do Garden District
ONDE COMER
O bairro de Marigny (lê-se marôni) merece várias visitas devido a infinidade de estabelecimentos servindo o bom e o melhor. Para o café da manhã ou almoço, o Who Dat Coffee Cafe serve o inconfundível Not your Mama's Corn Cake, um bolo de milho coberto por queijo cheddar, bacon e cebola. Na mesma rua, mas com outras seis unidades espalhadas pela cidade, o Ruby Slipper Cafe conta com um menu mais completo e atendentes muito simpáticos, por lá provei o delicioso BBQ Shrimp and Grits, prato que leva uma espécie de mingau de milho com camarão e molho barbecue.
Ainda no bairro, o The Elysian Bar é anexado a um hotel finíssimo e tem preços mais salgados, mas é perfeito para uma ocasião especial. Com uma atmosfera intimista, vale ser visitado pelos drinks, decoração exuberante e comida, que leva frutos do mar em sua grande parte, como o delicioso nhoque de caranguejo com ricota. Para mais sabores aquáticos, faça uma parada no St. Roch Market, um mercado gastronômico que abriga o Elysian Seafood, onde as ostras saem por US$ 1 e que serve a tradicional sopa gumbo, picante e com frutos do mar. No bar Mayhaw, também dentro do mercado, vale tomar um hurricane, drink local que leva rum e xarope de frutas vermelhas.
Outro prato tradicional de New Orleans é o po-boy, sanduíches de pão francês estufado com diferentes tipos de carne que pude provar no Mahony’s, um dos mais tradicionais para saboreá-los. Já o doce mais popular é o beignet (bêniê), que nada mais é do que um bolinho de chuva grande, geralmente vendido numa porção com três, suficiente para ficar satisfeito. Para prová-los em seu melhor sabor, vá até uma das várias unidades do Café Beignet, onde sempre estão frescos e quentinhos, diferente dos vendidos no Café du Monde, que só tem fama pelo nome. 
Agora, famosa com razão é a Creole Creamery, uma sorveteria onde até as celebridades que estão gravando projetos na cidade esperam na fila para provar alguns dos 40 sabores preparados ali. Se não quiser esperar por um sorvetinho, dê um pulo na Sundae Best e confira as opções do dia.
Ostras e gumbo do Elysian Seafood
Ostras e gumbo do Elysian Seafood
Beignets do Café Beignet
Beignets do Café Beignet
Nhoque de caranguejo do Elysian Bar
Nhoque de caranguejo do Elysian Bar
BBQ Shrimp and Grits do Ruby Slipper
BBQ Shrimp and Grits do Ruby Slipper
ONDE BEBER
New Orleans é uma das poucas cidades americanas onde o consumo de álcool nas ruas é permitido, especialmente no French Quarter, berço da caótica Bourbon Street (viu, até a rua tem nome de bebida), onde é normal encontrar dezenas de pessoas segurando um copão de litro de alguma-coisa-bem-forte.
Para visitantes de primeira viagem, é quase que obrigatório saborear uma frozen daiquiri (décurí) enquanto se percorre as ruas do antigo bairro. Com preço baixo, e alto teor alcoólico, a bebida tem base de rum e é misturada com algum xarope de fruta da sua escolha, e por ser gelada fica com a consistência de uma raspadinha. É uma delícia (quando bebida com moderação) encontrada em todos os estabelecimentos da Bourbon St., especialmente na Fat Tuesday, que conta com mais de 30 opções de sabores.
Muitos dos bares ao longo da Bourbon têm clima de balada, com caixas de som estourando algum gênero musical e luz baixa para a galera dançar sem vergonha, se essa não é sua vibe, vale conferir o jazz de qualidade apresentado todas as noites no Fritzel’s, que serve drinks com valores inflacionados.
Entretanto, para uma experiência completamente fora das expectativas, vá até o final da rua e conheça o Lafitte's Blacksmith Bar. Com uma fachada praticamente se desfazendo, está de pé desde 1732, e diz ser a estrutura mais antiga dos EUA a ser usada como bar, e realmente deve ser, já que o clima de taverna ali dentro é sem igual. Com iluminação à base de velas, tem um ar misterioso que deixa tudo mais emocionante, sem contar a música de piano ao vivo, que embala hits de todas as épocas. O Voodoo Daiquiri é drink da casa e também um dos clássicos da cidade, que leva xarope de uva, everclear e whisky.
DICA: Depois de tanta bebedeira, vale fazer uma parada na hamburgueria 24 horas Krystal, localizada bem no início da Bourbon Street, que é perfeita pra curar a ressaca durante a madrugada ou pra quem tem pouca grana, já que o cheeseburger sai por volta dos USD 1,50.
Fachada do Lafitte's Blacksmith
Fachada do Lafitte's Blacksmith
Interior do bar de jazz Fritzel's
Interior do bar de jazz Fritzel's
Copo de 1L de daiquiri
Copo de 1L de daiquiri
O QUE FAZER
Convenhamos, andar sem rumo pela cidade é como percorrer um museu a céu aberto, principalmente pelas construções bem preservadas e traços europeus bem característicos, mas se fosse para destacar três atrações, elas seriam: a Historic New Orleans Collection, que exibe um acervo repleto de objetos marcantes para a história da cidade, além de exposições temporárias de artistas contemporâneos (gratuito); a New Orleans Pharmacy Museum, dedicado a uma extensa coleção de objetos da medicina do século 19, que são um tanto macabros (USD 10); e a Preservation Hall, uma casa de shows minúscula, super simples, mas com o melhor jazz da cidade (USD 50).
Outras coleções que visitei foram as das mansões Hermann-Grima House e 1850 House, ambas exibindo mobílias e objetos característicos de famílias ricas que viveram em NoLa por volta dos anos 1800. Além dos parques e cemitérios, as praças são uma boa parada para admirar os arredores, em especial a Jackson Square, com a icônica St. Louis Cathedral ao fundo, e a Lafayette Square, cercada por belos edifícios. 
Claro que a cidade tem muitos outros museus, como o da Segunda Guerra Mundial, do Jazz, e o de Arte, mas todos têm entrada cobrada. Além disso, outra opção de entretenimento pela cidade são os tours, sejam históricos, focados no sobrenatural ou pelos pântanos espalhados pelas redondezas, como os oferecidos pela Gators and Ghosts. Para os fãs de teatro ou shows, o luxuoso Seager Theatre recebe montagens de peças da Broadway, assim como apresentações musicais de diferentes artistas.
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Um dos quartos da Hermann-Grima House
Um dos quartos da Hermann-Grima House
Sala com milhares de objetos da New Orleans Pharmacy Museum
Sala com milhares de objetos da New Orleans Pharmacy Museum
Músicos no salão da Preservation Hall
Músicos no salão da Preservation Hall
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